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Bonas Histórias

O Bonas Histórias é o blog de literatura, cultura, arte e entretenimento criado por Ricardo Bonacorci em 2014. Com um conteúdo multicultural (literatura, cinema, música, dança, teatro, exposição, pintura e gastronomia), o Blog Bonas Histórias analisa as boas histórias contadas no Brasil e no mundo.

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Ricardo Bonacorci

Nascido na cidade de São Paulo, Ricardo Bonacorci tem 42 anos, mora em Buenos Aires e trabalha como publicitário, produtor de conteúdo, crítico literário e cultural, editor, escritor e pesquisador acadêmico. Ricardo é especialista em Administração de Empresas, pós-graduado em Gestão da Inovação, bacharel em Comunicação Social, licenciando em Letras-Português e pós-graduando em Formação de Escritores.  

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Livros: Mensagem - A obra-prima de Fernando Pessoa


Mensagem de Fernando Pessoa

A maioria dos brasileiros conhece os versos de “Mar Português”, um dos poemas mais famosos de Fernando Pessoa. Há quem os tenha decorado: “Ó mar salgado, quanto do teu sal/São lágrimas de Portugal!/Por te cruzarmos, quantas mães choraram/Quantos filhos em vão rezaram!/Quantas noivas ficaram por casar/Para que fosses nosso, ó mar!/Valeu a pena? Tudo vale a pena/Se a alma não é pequena./Quem quer passar além do Bojador/Tem que passar além da dor./Deus ao mar o perigo e o abismo deu,/Mas nele é que se espelhou o céu.” Estes versos são realmente incríveis. Impossível não se emocionar com sua leitura.

Paradoxalmente à fama dos versos de Fernando Pessoa, pouca gente deste lado do Atlântico leu efetivamente o livro em que este poema foi publicado. Infelizmente, a maioria da população brasileira não conhece sequer o título da obra onde o poema foi editado. Coisas de Brasil... Para sair dessa vergonhosa estatística, li, ontem à tarde, “Mensagem” (L&PM Pocket), a principal obra do maior poeta português do século XX. Agora, aproveito este post do Blog Bonas Histórias para compartilhar com vocês minhas impressões sobre este livro.

Publicado em 1934, “Mensagem” chegou às livrarias portuguesas um ano antes da morte de Fernando Pessoa e um ano após a criação do Estado Novo, governo de estilo fascista de Oliveira Salazar. Curiosamente, este é o único livro em língua portuguesa publicado em vida por Fernando Pessoa. O restante de sua obra literária (inclusive os materiais de seus 72 heterônimos) só foi descoberto nos baús da casa do poeta após seu falecimento.

Fernando Pessoa

A importância de “Mensagem”, contudo, vai além dessa posição de exclusividade. Sua relevância está nos prêmios conquistados, no seu tempo de desenvolvimento e na ambição de sua proposta artística.

Vale lembrar que a publicação ganhou, em 1934, o Prêmio Antero de Quental na categoria poema, uma das principais honrarias que um escritor português pode almejar. Ou seja, no final da vida, Fernando Pessoa já era visto como um dos grandes escritores contemporâneos de seu país. Ano a ano, após seu falecimento, sua dimensão artística só aumentou, fazendo dele um dos maiores de toda a história da literatura lusitana.

“Mensagem” reúne os poemas escritos por Fernando Pessoa entre 1913 e 1934. São mais de duas décadas de desenvolvimento do livro. Não é errado afirmarmos que se trata de uma produção que consumiu boa parte da vida do poeta. Ao longo deste período, o escritor pesquisou, criou, alterou e maturou seus textos, em um trabalho classificado como árduo. No início, a coletânea de poemas se chamaria “Portugal”. Somente no final da empreitada ela ganhou o título atual.

O mais interessante, em minha opinião, foi a ambição de Fernando Pessoa com “Mensagem”. O escritor simplesmente desejava superar Luís Vaz de Camões e seu “Os Lusíadas” com este livro. Admitamos que a pretensão não era pequena... Suplantar a maior criação da literatura portuguesa e o maior escritor em língua portuguesa de todos os tempos não era tarefa fácil. Apesar de não ter conseguido alcançar esse patamar (na verdade, mesmo sendo uma obra-prima, “Mensagem” está a léguas de distância de rivalizar com “Os Lusíadas”), não podemos dizer que Pessoa não foi feliz com esta criação.

Livro Mensagem

Diferentemente do que muitos imaginam, “Mensagem” não é uma epopeia (como é “Os Lusíadas”, por exemplo). O livro de Fernando Pessoa é uma coletânea de poemas que analisa e comenta a história de Portugal, projetando um futuro glorioso para a nação mais ocidental da Europa. As diferenças para uma epopeia estão na estrutura menos fixa e na multiplicidade de vozes (algo impensável em uma obra épica). O que amarra os textos deste livro é sua temática ufanista, sebastianista, mística e utópica. É verdade também que “Mensagem” mistura muitos gêneros narrativos. O livro possui características líricas, dramáticas e épicas, constituindo uma obra extremamente singular tanto dentro do portfólio do escritor quanto no conjunto de títulos em língua portuguesa publicados no século XX.

“Mensagem” está dividida em três partes. Na primeira, chamada de “Brasão”, temos uma retrospectiva da formação da nação portuguesa. Aqui, Fernando Pessoa evoca os reis, as rainhas, os príncipes e os militares responsáveis pela fundação e pela consolidação de Portugal como uma pátria independente. De uma maneira genérica, essas grandes personalidades (Ulisses, Viriato, D. Henrique de Borgonha, Dona Teresa de Castela, D. Afonso I, D. Dinis I, D. João I, D. Duarte I, D. João I, D. Sebastião, Afonso de Albuquerque, etc.) cantam, cada um em um poema diferente, suas façanhas e seus triunfos históricos. Essas evocações não seguem uma ordem cronológica nem se atem aos fatos históricos (Ulisses, por exemplo, é considerado o fundador de Lisboa – algo que não passa de uma lenda portuguesa). A primeira parte da coletânea possui quase que metade dos poemas do livro. São 19 nesta seção.

Fernando Pessoa

A segunda parte, intitulada de “Mar Português”, os heróis lusitanos deixam de ser a família real e passam a ser os navegadores que desbravaram os oceanos do mundo para expandir o território do país. Os versos mencionam as grandes conquistas marítimas de Portugal. Novamente, cada poema é dedicado a uma personalidade, que pode “cantar” seus feitos. Temos aqui Diogo Cão, Bartolomeu Dias, Vasco da Gama, Fernão de Magalhães, entre outros. Essa é a menor parte da coletânea, com apenas 12 poemas.

A terceira e última parte do livro é chamada de “Encoberto”. Se até então Fernando Pessoa fez a recapitulação da história do seu país, a partir desses versos ele irá olhar para o futuro. Os tempos de glória de Portugal voltarão, segundo o poeta, quando D. Sebastião regressar. O rei lusitano que sumiu na África no século XVI, voltará e transformará seu país no Quinto Império, conforme mencionado no Antigo Testamento. Ou seja, agora o texto de “Mensagem” se torna mais místico e utópico. “Encoberto” é um dos apelidos de D. Sebastião. Nesta última parte da coletânea, temos 13 poemas.

“Mensagem” é um livro extremamente curto. Em pouco mais de 100 páginas, temos 44 poemas de tamanho reduzido (raramente eles ultrapassam os 12 versos). Os versos são concisos e recheados de elementos simbólicos, o que dificulta em muito a compressão dos leitores contemporâneos e daqueles que não conhecem em profundidade a história de Portugal. Se considerarmos simplesmente sua extensão, é possível ler “Mensagem” em menos de uma hora. Contudo, a leitura se torna muito mais lenta porque é preciso muita atenção aos versos e uma boa pesquisa as incontáveis referências deixadas pelo poeta em seu texto.

Admito que gostei de “Mensagem”. Os versos do livro são realmente muito bonitos e emocionantes. Contudo, não achei esta obra à altura de “Os Lusíadas”, como Fernando Pessoa almejava. Se formos comparar a coletânea de poemas de Pessoa à epopeia de Camões, acho que o confronto é extremamente injusto para o escritor do século XX. Nada até hoje chega aos pés da obra máxima da língua portuguesa. Por outro lado, se formos analisar “Mensagem” sem essa comparação descabida, na certa veremos esse título com olhos muito mais positivos. Sem dúvida nenhuma, esta é uma obra-prima da literatura portuguesa e a criação máxima de Fernando Pessoa. Vale a pena conhecê-la por completo (e não apenas por um poema isolado – por melhor que ele seja).

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