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Bonas Histórias

O Bonas Histórias é o blog de literatura, cultura, arte e entretenimento criado por Ricardo Bonacorci em 2014. Com um conteúdo multicultural (literatura, cinema, música, dança, teatro, exposição, pintura e gastronomia), o Blog Bonas Histórias analisa as boas histórias contadas no Brasil e no mundo.

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Ricardo Bonacorci

Nascido na cidade de São Paulo, Ricardo Bonacorci tem 42 anos, mora em Buenos Aires e trabalha como publicitário, produtor de conteúdo, crítico literário e cultural, editor, escritor e pesquisador acadêmico. Ricardo é especialista em Administração de Empresas, pós-graduado em Gestão da Inovação, bacharel em Comunicação Social, licenciando em Letras-Português e pós-graduando em Formação de Escritores.  

  • Foto do escritorRicardo Bonacorci

Romances: Primeira Página - O Amigo Lá Das Alturas

Engatar as Personagens é o recurso narrativo que confere unidade à história e ajuda os leitores na compreensão da trama ficcional desde os parágrafos iniciais.

Primeira Página - O Amigo Lá Das Alturas - Ricardo Bonacorci

Prazer, sou o Ladas. Mas pode me chamar de Lá, Lad, Lada, Ladeco, Ladico. Ou de Ladas mesmo. Normalmente me chamam dessas formas. Se eu fosse como James Bond, diria: sou Alturas, Ladas Alturas. Sim, esse é o meu nome real e completo – Ladas Alturas. Ele pode parecer engraçado agora, o que gera frequentemente brincadeirinhas e até certo bullying, e combinar com minha profissão, em uma incrível coincidência do destino. Porém, só fui perceber isso ao viajar para cá. De onde venho, meu nome é extremamente comum e jamais despertaria grandes curiosidades.


Quando cheguei?! Deve fazer uns vinte anos, segundo a medição do tempo de vocês. Quando coloquei os pés nesse planeta, trazia a presunção típica dos jovens, a esperança das almas mais inocentes e a disposição de quem não tem nada a perder. Vim com uma missão clara: concluir o estágio obrigatório e receber meu diploma de anjo. Afinal, segundo a instituição que cursei, em nada adiantava o longo período de estudo e a vasta bagagem conceitual adquirida. Se não realizássemos a parte prática, não poderíamos pegar o caneco. Sempre achei tudo isso muito burocrático, mas fazer o quê? Regras são regras e precisam ser respeitadas.


Confesso que, no começo, acreditava que essa profissão seria fácil. Por isso, não fiz como muitos de meus colegas que escolheram o local para onde seriam mandados. Como melhor aluno da turma, achei que poderia parecer fraqueza da minha parte qualquer tipo de direcionamento nesse sentido. Com esse pensamento, não titubei e cravei no item 7 do formulário de requisição do estágio – qualquer lugar.


Por causa do preenchimento de um campo, um mísero campo na ficha estudantil, acabei aqui. Ai, ai, ai. Não é que eu esteja reclamando, por favor, não pense besteira. Só estou explicando que foi um choque cultural. Ou de expectativas. Esperava uma coisa e encontrei outra completamente distinta. Diferentemente do que vocês possam achar, vida de anjo não é moleza. Além do acúmulo absurdo de tarefas diárias (ninguém pensa que temos relatórios para preencher, longas viagens para efetuar e intermináveis reuniões para comparecer) e do aumento exponencial de atendimentos nas últimas décadas (vocês não se incomodam com a superlotação desse planeta, Santo Deus!), eu não imaginava que fosse lidar com seres tão irracionais, limitados cognitivamente, preconceituosos, violentos e, por que não, desumanos. Por mim, excluiria a Terra dos locais do universo que contam com vida inteligente sem pestanejar.


Desculpe-me falar desse modo. Agora que temos alguma intimidade, não precisamos mais ter tantos melindres, né? Vou ser o mais sincero possível nesse relato. E conto com a colaboração de todos para seguirmos em frente sem rodeios ou falso moralismo.


Quando cheguei, minha missão era aparentemente simples. Precisava ajudar quatro pessoas. Vocês entendem o que são pessoas, certo? Pessoas, seres humanos. Precisava ajudar quatro seres humanos. Se tivesse êxito na maioria dos casos, o diploma iria para as minhas mãozinhas e ponto final. Se fracassasse na maioria das tarefas, precisaria refazer o estágio novamente. E se houvesse um empate (dois casos exitosos, dois casos arruinados), a banca de professores do Instituto Superior do Plano Superior (ISPS) daria o veredito a partir do histórico do aluno.


Como o mais brilhante estudante da minha classe (e para muitos o melhor universitário das últimas gerações!), eu não cogitava as duas últimas opções. Talvez o Nicólas, o Noas e o Perminas precisassem refazer o estágio. Se alguém me perguntasse, diria previamente que acreditava que o Andreas, o Belauras e o Perminas acabassem na banca avaliadora. Em sã consciência, ninguém cogitava que o meu destino fosse outro a não ser pegar de primeira o diploma. Para ser sincero, sincerão, minha intenção era chegar aqui e realizar o mais rapidamente possível meus quatro atendimentos. Como diria o Capitão Nascimento, missão dada, parceiro, é missão cumprida! Meu desejo era realizar minhas obrigações em um tempo recorde, só para aumentar a admiração de meus colegas e dos meus professores.


Por uma perspectiva exclusivamente racional, os casos que eu pegara não eram nada, nadinha complicados. Vejamos se eu não tinha razão. Maria Anunciación Freire. Vendedora argentina de 29 anos e mãe de duas crianças pequenas. Ela não conseguia sair de uma relação abusiva. O marido era folgado, violento e infiel. Qual a dificuldade de dar um pé na bunda dele? Nenhuma. Romildo de Sousa. Brasileiro, 19 anos, motoboy e evangélico. Ele vivia às turras com o irmão gêmeo. O motivo? Descobriu que o brother era gay. Qual a complexidade para aceitar as opções sexuais de um parente, hein? Nenhuma.


Théodore Ivy. Empresário australiano de 42 anos, casado e pai de um casal de filhos. Sua família passava por uma grave crise financeira. Enquanto ele administrava muito mal sua empresa, todos na casa, inclusive ele, gastavam dinheiro sem pensar no amanhã. É difícil controlar as manias consumistas de alguém? Não, né? E, por fim, temos Francisca Almeida Vieira. Universitária portuguesa de 27 anos, ela trabalhava como modelo internacional e era invejada por sua beleza estonteante. Seu problema? Tinhas pensamentos suicidas. Dá para acreditar?! Eu precisava simplesmente evitar que ela tirasse a própria vida.


Se pensarmos bem, nenhuma dessas tarefas era complicada. Pelo menos não para mim. Eu sabia o que tinha que fazer e tinha ciência da minha capacidade para influenciar positivamente os atendidos. Quanto tempo eu precisaria para regressar feliz da vida para o meu mundo? Alguns dias. Talvez poucas semanas. No máximo um mês, um mês e meio. Esse era o meu plano. Eu só não contava que seria atrapalhado o tempo inteiro justamente pelos indivíduos que deveria auxiliar.


Eita vida desgramada essa de anjo, oh Pai! Por que não fui enviado para Alpex Lunar ou para algum satélite natural de Calcix, hein? Às vezes acho que o ser humano não tem solução mesmo! Fazer o quê, diacho?


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“Primeira Página” é a sétima série narrativa da coluna Contos & Crônicas. Nessa nova coletânea de textos do Bonas Histórias, Ricardo Bonacorci apresenta, ao longo de 2021, a primeira página de oito possíveis romances. A ideia é mostrar a força e a intensidade dos parágrafos iniciais das tramas ficcionais. Enquanto tenta cativar a curiosidade dos leitores, Ricardo utiliza (e explica suscintamente) algumas técnicas clássicas de abertura narrativa.


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Técnica utilizada em “O Amigo Lá Das Alturas ”: Engatar as Personagens.


Engatar as Personagens é a estratégia de início de narrativa em que os autores ficcionais prezam pela concisão e pela precisão. Em poucas linhas, eles apresentam as principais personagens da trama de um jeito integrado. Os leitores, assim, compreendem a lógica por trás das figuras retratadas e da trama proposta. Quando entendemos logo de cara o cenário, o conflito e as pessoas envolvidas, fica mais fácil para acompanharmos o desenrolar daquela história que está começando.


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