No quinto programa dessa temporada, Darico Nobar entrevista a personagem mais famosa da literatura infantil de Ruth Rocha.
Darico Nobar: Boa noite, galerinha do Talk Show Literário. Sejam muito bem-vindos a mais uma entrevista do melhor programa de televisão da ficção brasileira. O nosso convidado de hoje é o protagonista de um dos contos mais famosos da literatura infantil. Agora, com vocês, Marcelo!!!
[Sob os aplausos do público, menino loirinho vestindo camiseta marrom, short vermelho, meias amarelas e tênis branco surge no meio da plateia. Ele caminha até o entrevistador no centro do palco. Apesar da baixa estatura, ele pula no sofá sem dificuldade e se ajeita].
Marcelo: Quem é você? [Balança os pés que ficam flutuando no alto do assento].
Darico Nobar: Oi, Marcelo. Eu sou Darico, o apresentador desse programa. Saiba que é um prazer conhecê-lo pessoalmente.
Marcelo: Por que você se chama Darico?
Darico Nobar: Porque... porque... [Dá uma leve gaguejada]. Nunca pensei nisso. Acho que foi porque o meu pai e a minha mãe escolheram esse nome para mim.
Marcelo: E por que é que não escolheram Daronco?
Darico Nobar: Ah, Marcelo, Daronco não é nome de artista das letras! É nome de juiz de futebol...
Marcelo: Por que é que não escolheram damasco?
Darico Nobar: Porque damasco é nome de fruta, menino!
Marcelo: E a fruta não podia chamar Darico, e você chamar damasco?
Darico Nobar: Poder até podia, mas não foi assim que as coisas aconteceram. O fato é que damasco é nome de fruta e Darico é nome de gente, é meu nome.
Marcelo: Por que é que ônibus chama ônibus?
Darico Nobar: Porque essa palavra vem do latim. Omnibus significava “para todos”. [Faz as aspas com os dedos].
Marcelo: Puxa, do latim? E latim não é língua de cachorro?
Darico Nobar: Até poderia ser... [Ri com gosto do comentário do garoto]. A língua dos cachorros é o latido. Sabe, Marcelo, o latim é uma língua de gente e é um idioma muito, muito antigo.
Marcelo: E por que esse tal de latim não botou no ônibus nome de carro, no carro nome de motocicleta, e na motocicleta nome de bicicleta?
Darico Nobar: Ai, meu Deus, este menino está me deixando louco. Ele não para de fazer perguntas. [Vira o corpo e olha desolado para a câmera 2, que está posicionada ao seu lado. Sua fala sai baixinho e lembra mais uma confissão].
Marcelo: E se o tal de latim botou nome errado nas coisas? Será que estamos falando tudo errado por causa dele?
Darico Nobar: Isso não é uma coisa que me tira o sono. Se eu fosse você, Marcelo, não ficaria tão preocupado com essas questões.
Marcelo: Pois eu fico, está tudo errado. Bola é bola, porque é redonda. Mas bolo nem sempre é redondo, né? E por que será que a bola não é a mulher do bolo? E bule? E belo? E bala? Eu acho que as coisas deviam ter nomes mais apropriados. Cadeira, por exemplo. Devia chamar sentador, não cadeira, que não quer dizer nada. E travesseiro? Devia chamar cabeceiro!
Darico Nobar: Sabe que você não está totalmente errado no que está falando. [Apoia a mão no queixo e coça a barba]. Até hoje não sei o porquê estranho não é uma palavra estranha, mas estapafúrdio é uma palavra estapafúrdia.
Marcelo: Está vendo! Estou falando, está tudo errado.
Darico Nobar: Alegria é uma palavra mais curta que tristeza. Para o bem de todos, penso que poderia ser o inverso. Alegria deveria ser grandona, tipo anticonstitucionalissimamente. E tristeza podia ser bem curtinha, igual a só, nó e lá.
Marcelo: Tristeza combina mesmo com só e nó. E bem que poderia ficar lá.
Darico Nobar: Exatamente!!!
Marcelo: Por essas e outras é que eu inventei nomes melhores para as coisas.
Darico Nobar: Você fez muito bem. É um jeito de acabar com essa confusão.
Marcelo: Vamos ver se você adivinha. O que é suco de vaca?
Darico Nobar: Leite.
Marcelo: Muito bem. E grudador.
Darico Nobar: Grudador... grudador... [Olha para cima]. Cola! É a cola comum.
Marcelo: Certo! E moradeira?
Darico Nobar: Essa é moleza, molezinha. É casa.
Marcelo: Não dá para brincar com você, damasco.
Darico Nobar: É Darico.
Marcelo: Acertou outra.
Darico Nobar: Marcelo, isso não é um programa de adivinhação.
Marcelo: Outra coisa que está muito errada aqui. Programas de adivinhação são muito mais legais que programas de entrevista. Acho que só meu pai deve ver o Talk Show Literário.
Darico Nobar: Fico imaginando como deve sofrer a professora desse menino. [A fala sai novamente em um tom baixinho, mas dessa vez ela é ouvida pelo entrevistado].
Marcelo: A ensinadora sofre bastante com os aprendidores. A pior de todas é a Gabriela. Darico, conhece Gabriela sapeca, Gabriela levada, Gabriela serelepe?
Darico Nobar: Não conheço, não.
Marcelo: É minha amiguinha lá na missa sem reza. Ela é amiga de todo mundo para falar a verdade. Até da Teresinha. No começo não, mas agora elas são inseparáveis.
Darico Nobar: Missa sem reza... missa sem reza... calma que eu vou adivinhar. Não preciso de ajuda. Espera. Missa sem reza. Claro! É a escola. Missa sem reza porque é uma obrigação chata que a criançada precisa ter para agradar aos adultos, os Deuses mandões.
Marcelo: A Gabriela não deixa a ensinadora em paz. Vive fazendo perguntas malucas. É um tal de céu da boca tem estrela? Barriga da perna tem umbigo? Pé de alface tem calo?
Darico Nobar: Não deve ser fácil conviver com quem passa o dia fazendo perguntas.
Marcelo: O problema não é a pergunta em si. O problema é fazer pergunta besta. Você faz pergunta besta, Darico, Daronco, damasco?
Darico Nobar: Espero que não.
Marcelo: Meu pai disse que você só faz pergunta besta. Ele não gosta do seu programa. Só vê para conseguir dormir rápido.
Darico Nobar: Ah! [Faz uma careta].
Marcelo: É o que ele fala. Gente grande não entende nada de nada, mesmo!
Darico Nobar: Tenho uma pergunta para você.
Marcelo: Vou adivinhar. Você quer saber quem é o meu melhor amigo, certo?
Darico Nobar: Não era bem essa a minha questão.
Marcelo: Depois do Latildo, é o Caloca o meu melhor amigo. Antigamente não, ele era o menino mais enjoado de toda a rua. E não se chamava Caloca, claro. Era só Carlos Alberto. Mas depois ele mudou. Agora é um amigo legal. [Fica alguns segundos em silêncio]. Mas não era isso o que você queria saber, né? [Apresentador balança a cabeça concordando]. Já sei. Qual é a minha brincadeira favorita?
Darico Nobar: Também não era isso. [A voz sai desanimada].
Marcelo: Essa é fácil. Palavra cruzada.
Darico Nobar: Sei. [Cruza os braços].
Marcelo: Por que você não pergunta o que eu quero ser quando crescer? Todo mundo pergunta isso o tempo inteiro.
Darico Nobar: Nem preciso, acho que já sei. Você será o novo Professor Pasquale.
Marcelo: Ensinador? Cruz credo! Quero é ser jogador de futebol, igual ao Neymar. Vou sair por aí driblando todo mundo. [Mexe os pezinhos no ar simulando os lances].
Darico Nobar: Está bem, Marcelo. Obrigado pela entrevista de hoje. Pode voltar a brincar que eu vou encerrar o programa.
Marcelo: Valeu pela papoeira, seu damasco. Bom lunário!
[O menino pula do sofá e corre para trás do palco, onde estão os camarins. A imagem é captada por um take aberto da câmera 1. O público presente no auditório aplaude a cena].
Darico Nobar: Pessoal, obrigado por acompanharem mais um Talk Show Literário. [Olha em close na câmera 3]. Eu fico agora por aqui, mas na semana que vem teremos mais uma entrevista ao vivo e exclusiva com uma personagem dos clássicos da literatura brasileira. Não perca. Até a próxima! E bom lunário para todos.
[Enquanto os créditos da atração televisiva sobem na tela, o diretor do programa corta o áudio dos microfones para que o público não ouça o que será dito no palco. A imagem é novamente do take aberto da câmera 1. Por ela, se vê o apresentador falando sozinho].
Darico Nobar: Essa entrevista foi difícil pra caramba. Não pensei que conversar com um garotinho fosse ser tão complexo.
Diretor do programa: Darico, esse foi o primeiro talk show em que você não fez uma pergunta sequer, sabia? [A fala é transmitida pelo ponto colocado no ouvido do âncora].
Darico Nobar: Não é possível! Devo ter feito algumas perguntas sim.
Diretor do programa: Não, você não fez. Suba à minha sala agora mesmo. Venha assistir à entrevista. Ao invés de entrevistar o Marcelo, você foi entrevistado por ele.
Darico Nobar: Meu Deus! [Se levanta e sai do palco].
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O Talk Show Literário é o programa de televisão fictício que entrevista as mais famosas personagens da literatura. Assim como ocorreu nas quatro primeiras temporadas, neste quinto ano da atração, os convidados de Darico Nobar, personagem criada por Ricardo Bonacorci, são os protagonistas dos clássicos brasileiros. Para acompanhar as demais entrevistas, clique em Talk Show Literário. Este é um quadro exclusivo do Blog Bonas Histórias.
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